Mariana Mandelli, do Todos Pela Educação
De São Carlos (SP)

Apesar de apresentar um crescimento considerável nos últimos anos e ser encarada como uma espécie de solução para a expansão do Ensino Superior no Brasil e no mundo, a Educação à Distância ainda enfrenta preconceitos e resistências em diversos âmbitos, especialmente no que tange à formação de professores. As críticas normalmente estão centradas em uma distância ainda maior entre futuro professor e sala de aula, uma vez que grande parte do curso é online, aumentando o tão falado fosso entre universidade e chão da escola.

Na contramão desse estereótipo, o curso de Pedagogia à distância da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) é reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC) e por especialistas na área como um caso de sucesso. Além de ter recebido notas máximas na avaliação do governo federal em 2013 e sido incluído entre as 13 graduações – de 1.207 – de excelência nessa modalidade em todo o País, o curso foi citado na pesquisa “Formação de Professores no Brasil: Diagnóstico, Agenda de Políticas e Estratégias para a Mudança”, realizada com apoio do Todos Pela Educação.

O estudo, que será lançado em maio, foi coordenado por Fernando Luiz Abrucio, da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, mantida pela Fundação Getulio Vargas (FGV), e realizado juntamente às pesquisadoras Catarina Ianni Seggatto, Ana Paula Massonetto, Érica Farias e Catherine Rojas Merchán. Com base em entrevistas e revisão bibliográfica, a pesquisa mostra que a articulação do tripé universidade-redes-escola é fundamental para a qualidade da formação docente.

Nesse sentido, a Ufscar foi citada como uma instituição que insere os alunos na prática docente desde o início do curso, como ocorre no presencial (leia mais aqui). “Não separamos EAD de presencial no nosso Plano Institucional. Ambos estão sob o guarda-chuva da pró-reitora de graduação e são tratados da mesma forma”, explica a pró-reitora Cláudia Reyes.
Para administrar o curso de Pedagogia e outros, a universidade criou um órgão específico: a Secretaria Geral de Educação a Distância (Sead), composta pela Coordenadoria de Processos de Ensino-Aprendizagem (CoPEA), Coordenadoria de Inovações em Tecnologias na Educação (CITE), Coordenadoria de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento Profissional em EaD (CoDAP), Coordenadoria de Relações Institucionais (CoRI) e Coordenadoria de Administração e Planejamento Estratégico (CAPE).

A estrutura, segundo a pró-reitora, é fundamental para que o curso funcione bem. “Na estrutura da universidade, as secretarias têm basicamente o mesmo status das pró-reitorias”, afirma Cláudia. “A nossa Pedagogia EAD é um curso sólido, não tem uma evasão alta perto dos outros cursos. Uma turma de 50 alunos, por exemplo, costuma formar 48.”

O curso
A Pedagogia a distância foi criada na universidade em 2007 – a primeira turma formou-se em 2012. O curso tem carga horária de 3.200 horas, o que totalizam quatro anos. Algumas aulas são presenciais e ocorrem em 14 polos (todos no Estado de São Paulo). Os alunos têm atividades e materiais disponíveis em um ambiente virtual de aprendizagem (moodle), como ocorre em praticamente todos os cursos do tipo.

“Nossa proposta pedagógica foi feita por um grupo de professores da Ufscar. Por essa razão, tem um viés em que o aluno, desde o primeiro dia de aula já vislumbra a atividade docente. Tentamos aproximá-lo da escola desde o início do curso, levantando suas concepções previas sobre o ambiente escolar”, explica Aline Reali, docente do Departamento de Metodologia de Ensino e coordenadora da Sead. “Ao longo do curso ele deve ir construindo uma ideia mais formalizada disso tudo, sabendo dos limites e potencialidades que o professor tem e criando um olhar profissional sobre a escola, até que chegue o momento dos estágios e das práticas.”

O diferencial da Ufscar está justamente em como se dá o processo de estágio desses estudantes: os coordenadores do curso formam os professores da rede pública que receberão os alunos da Ufscar, transformando-os em tutores que efetivamente fazem – e se sentem – parte do processo de formação desses licenciandos.

Dessa forma, um estudante de Pedagogia EAD da Ufscar tem, além do supervisor formal de estágio – que é um docente da universidade –, um professor municipal ou estadual que atua como co-formador. Segundo Aline, que foi coordenadora pedagógica do curso logo na criação dele e trabalha com formação docente há 25 anos, esses professores da rede não são escolhidos a esmo: são identificados, com base no diálogo com as escolas, aqueles com o melhor perfil para isso, com no mínimo cinco anos de docência e concursados – e, claro, que queiram receber os futuros professores. Antes, havia bolsas para esses tutores. No momento, por conta de restrições orçamentárias, a universidade não tem concedido o benefício.

Depois de escolhidos, os professores que receberão os estagiários passam por uma formação de cerca de 30 horas – também a distância –, oferecido pelo Portal dos Professores, uma plataforma da Ufscar dedicada a estabelecer um vínculo entre a universidade e os profissionais da rede pública (saiba mais aqui). “De uma perspectiva metodológica, pensamos em como a prática desse aluno dentro de uma escola poderia se realizar, partindo de alguns dados e pesquisas feitas em vários lugares de mundo. Assim, pensamos que teríamos que capitalizar a interlocução dele com o professor da rede que o recebe, potencializando essa interação no sentido de ela atender os objetivos de uma formação qualificada”, afirma Aline.

O intuito é, portanto, que a escola funcione realmente como um ambiente formativo para o estagiário, com esse professor-tutor como uma espécie de modelo para esse licenciando. “É por isso que esse professor tem que estar preparado para receber nosso aluno. Tínhamos que oferecer essa formação, até mesmo para criar uma interlocução com ele e facilitar o acompanhamento do estágio. Se ele é um formador, isso precisa ficar claramente definido para ele – e também precisamos valorizá-lo como tal”, conta ela. “Se esse professor não estive capacitado para receber, o aluno vai ter um contra-exemplo. Pesquisas mostram que alguns alunos desistem da carreira por causa da experiência traumática.”
Cláudia complementa: “As professoras (que recebiam os estagiários) foram querendo fazer de novo, porque era algo bacana para elas também, porque podiam transformar o horário de trabalho coletivo pedagógico em algo sólido, já que sabemos que, dependendo do gestor da escola, o HTPC muitas vezes nem acontece”.